O quadro e a vida.


Corria o ano de 2011 quando decidi presentear a nossa casa com esta serigrafia por altura do Natal. O Mestre Resende morrera em 21 de Setembro e eu, que já namorava a obra, decidi que não passaria desse ano. 2011 foi, por vários motivos, um ano marcado a fogo. Motivos maus. Motivos bons. Fechava-se, assim, neste presente. Prometida estava uma parede branca que viria a existir com as "obras". As obras em que pensáramos no dia 27 de Fevereiro de 2010, aquando da assinatura do contrato de promessa de compra e venda da nossa casa. As obras que decidimos deixar para depois da Festa. As obras que se viriam a iniciar a 30 de Maio de 2013 - curiosa e rigorosamente a tempo de me ver completar 32 anos. Nesse dia, abandonei o lar e rumei a casa dos meus pais. Eu e a Madalena, ainda apenas uma. E o Pedro lá se juntava a nós aos fins-de-semana. 26 semanas de gestação mais coisa menos coisa. Queríamos a casa a tempo de receber a nossa vida a três. Eu queria a tempo de ainda fazer o ninho para a terceira. Não foi assim. Como é normal as obras atrasaram-se. O primeiro quarto da Madalena foi o quarto onde passei a minha adolescência e faculdade. A primeira viagem da Madalena dirigiu-se para casa dos avós. Nas primeiras fotografias a Madalena tinha um recanto (o mais mágico que esta mãe soube fazer, mas não era o quarto dela!). Esse primeiro mês em casa dos meus pais transformou-se numa benção. Não há por onde dizer que não tenha vindo mesmo a calhar. Ao fim de 15 dias o Pedro voltou à labuta alentejana e a minha mãe foi tudo. Aliás, como agora vejo de outra perspectiva, são sempre! No início de Outubro lá as coisas se compunham. Com a Madalena sempre atrás e os carros cheios a vida foi tomando forma no nosso lugar. Rumámos ao Alentejo para uma semana a três e a 4 de Novembro, com toda coragem necessária (e "esperança legítima") passei a primeira noite com a minha filha. As duas. E daí em diante todas. 

Neste espaço de tempo nem sempre houve tempo para escrever. Ou, pelo menos, para escrever aqui. Neste espaço de tempo, aprendi a gerir refeições, idas ao Centro de Saúde, idas à Pediatra, passeios à beira-mar, passeios no parque, ginástica pós-parto, cabeleireiro, lanches com os amigos, buscar a mãe a Espinho, jantar com os pais, jantar em casa, ter gente para jantar; a primeira sopa, a primeira papa, horários das sestas, brincadeiras, risos; adormecer ao colo? adormecer sozinha? embalá-la no carrinho?

Tirei licença alargada. O que, a somar às férias engolidas pela baixa, me punha a trabalhar a 17 de Junho. 9 meses em casa a cuidar da pequena pareciam-me um cenário de sonho (...sei agora que não têm preço. O fascínio de ver crescer o meu bébé é muito maior do que podia imaginar no início desta aventura).

Mas a vida havia de ter outros planos para mim. Para nós.

Em Fevereiro, lá para o meio, chegava a notícia: seremos quatro! Quatro? Sim. Quatro. Bem... por mim passaram todas as emoções. A Madalena foi mais que planeada. Toda a minha vida, aliás, foi muito planeada. Nem sempre certa, é certo, mas detesto surpresas e poucas vezes lhe perdi a mão. Seremos quatro. A minha mãe assustada. O meu pai incrédulo. Eu também. Eu também. O Pedro sempre feliz. A Madalena sem perceber nada. E a pergunta. E agora? 

Daí em diante foi tudo o que se seguiu. A Madalena a crescer saudável e feliz. Eu mais cansada, mas a dar o meu melhor: O nervosismo de mãe no dia do baptismo; os quatro de férias em Sagres; as fotografias que ficarão para sempre; a realidade de não retomar o meu trabalho; nova baixa. Aqui estamos.

Nisto, ou melhor, neste tempo a casa ganhou sofá, mesa, cadeiras, tapetes, cortinas, um quarto de bébé "comme il faut"; ganhou uma empregada, uma bimby, um aspirador em termos, uma varinha mágica com três funções, um serviço de pratos finalmente completo; ganhou um quarto do meio onde não se mete pé; ganhou um tapete de actividades que deu lugar a uma piscina de bolas que passou a parque e agora também mesa de instrumentos. Ganhou novas cores e sons e risos e obras completas. 

... e ganhou este quadro finalmente pendurado na parede branca!

O nosso Pedro-O-Príncipe chegará, novamente, no Verão! Trará com ele a inquietação e o sonho. Não deixará a irmã lembrar-se que houve um tempo em que foi filha única. Fará os pais crescerem como pais. Cumprirá desejos. A sua primeira viagem, assim queremos, será para esta casa. Partilhará com a  Madalena o ninho que lhes construímos. E será feliz.


Comentários

Unknown disse…
Anoto com estima que o epíteto de "Pedro-O-Príncipe já é oficial :) Bless you all
Melancia disse…
Tão bom ter as tuas letras sempre românticas de volta!