'amarcord'

Há um dia em que te lembras do dia em que nasceste. Embora não te possas lembrar de como foi. Mas sabes que existiu, tem uma data, uma hora e é – terá de ser – o dia mais importante da tua vida.
Depois, há aquele em que pressentes que nascerás outra vez.
Há um dia em que acordas e te recordas de quase tudo o que passou por ti: dos cheiros às pessoas, dos sabores às descobertas, do ruído dos recreios e das salas de aulas, dos recados que fizeste passar nos cadernos, do choro compulsivo porque te disseram que não; ou porque a nota no teste não foi boa; ou porque não vais puder sair naquela noite; ou porque alguém se despede de ti ou porque alguém partiu, definitivamente.
Há um dia em que te sentas numa mesa de café e te lembras: dos livros que leste, da música que dançaste, dos filmes que viste e discutiste, das fotografias que tiraste e dos sorrisos nelas imprimidos, dos passeios da escola, das férias com os amigos, das viagens maiores e das mais pequenas…
Há um dia em que sais para trabalhar e te vem à cabeça o dia em que deixaste a primária. O dia em que entraste na faculdade. O dia em que pela primeira vez recebeste um salário… o dia em que pela primeira vez rodaste a chave de uma casa tua.
Relembras, então, os dias felizes na primeira pessoa. Quando eras só uma pessoa. E pressentes que nascerás outra vez!...

Comentários

Melancia disse…
e estas palavras soaram-me tão bem... Escritas com cheiro a futuro!
Ana disse…
Parabéns pela forma como sentes e escreves. Há um dia em que tudo faz mais sentido. Em que o que somos, por tudo o que passou, se projecta e se aperfeiçoa.