Fado


O fado || José Malhoa
fado
(latim fatum, -i, oráculo, previsão, profecia)
s. m.


Parabéns ao meu País... triste, amedrontado e cabisbaixo. Que fez dessa tristeza arte e ainda a tornou Património da Humanidade.

Eis que os meus olhos se lembram deste quadro. Deslumbrante na parede do Museu onde desagua a minha casa de Alfama.

Sem me esquecer das vozes entoadas. Ao vivo, sob a lua ou só em sonhos, nos paralelos sós dessas calçadas.

Mas hoje:

Escrevo fado e o meu coração troca-lhe as quatro letras pelas do nome da mais profunda saudade que trago.


O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

Ai, que lindeza tamanha,
meu chão , meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.

Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.

Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.

Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

José Régio
|| Fado Português

Comentários